terça-feira, 8 de setembro de 2009

Especial: Entrevista com o filho de Herculano Pires

Antes de sua partida, Herculano deixou vários originais escritos, os quais vêm sendo publicados pela Editora Paidéia, dirigida atualmente pela família. Herculano Ferraz Pires relata como foi a trajetória de vida de Herculano Pires, um dos jornalistas e divulgadores da doutrina espírita mais respeitados do Brasil.
"A vida ao lado de meu pai foi repleta de momentos marcantes, difícil destacar um em especial. Quem teve oportunidade de conviver com ele, sabe que era um espírito que transmitia calma e confiança no futuro".

Entrevista:

Como foi Herculano como pai, pessoa e jornalista?

Herculano Pires sempre foi a mesma pessoa em todos os aspectos, quer seja como pai, como cidadão ou como profissional. Sua grande virtude foi a sinceridade, que era cultivada com base nas verdades da doutrina espírita. Sempre foi o meu melhor amigo. Quando o procurava para receber conselhos sobre um problema sério, ele sempre me acalmava e mostrava que todas as dificuldades podem ser superadas, mas lembrando que as responsabilidades assumidas não podem ser negligenciadas. Como profissional, além do reconhecimento do seu valor pelos seus empregadores, foi eleito presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo, em 1957, o que prova como era respeitado pelos colegas de profissão.

Como era sua personalidade?


Tinha um belo senso de humor, a certeza de que o nosso verdadeiro mundo é o espiritual e que estamos apenas de passagem pela Terra para nos aperfeiçoarmos. Sempre nos lembrava que a lei da reencarnação nos mostra o quanto seríamos ignorantes ao criarmos qualquer tipo de preconceito, pois sabemos que a cada instante de nossa existência eterna estamos ocupando uma posição diferente, em uma nova encarnação, na sociedade dos homens.

Quais foram os principais meios de comunicação nos quais trabalhou?

Trabalhou em vários jornais e teve programa no rádio, porém esses programas não eram remunerados, visando apenas à divulgação da doutrina. Quanto à televisão, apenas teve participações como convidado, sendo exceção o caso da novela de Ivani Ribeiro A Viagem, na extinta TV Tupi, quando foi assessor para assuntos doutrinários, a convite da própria autora, por indicação de Chico Xavier.

Como foi a infância de seu pai, segundo seus relatos?

Segundo Jorge Rizzini registrou, no livro José Herculano Pires, O Apóstolo de Kardec, o próprio Herculano escreveu, em um de seus diários, a seguinte frase: "Tive uma infância com problemas de saúde que me acompanhariam por toda a vida. Mas a terra de Avaré e as águas do Rio Novo me fortaleceram."

E a fundação do Centro Espírita Cairbar Schutel?

Desde que me entendo por gente, me lembro das reuniões de estudos e reuniões mediúnicas realizadas em casa, por meu pai. Quando mudamos para a R. Dr. Bacellar, que possuía uma ampla garagem, as reuniões passaram a ter uma freqüência semanal e abertas para o público. Um certo dia, minha filha, que tinha aproximadamente oito anos, chegou na sala de jantar com um envelope que havia encontrado na caixa do correio e entregou ao meu pai. Estávamos reunidos com alguns amigos, e ao abrir o envelope, foi encontrado um volume de dinheiro, com um bilhete que dizia mais ou menos assim:

"Para vocês organizarem a creche que pretendem, assinado, um amigo". A partir desse momento meu pai achou que era necessário ser criado, juridicamente, um Grupo de Estudos Espíritas, e assim surgiu o Grupo Espírita Cairbar Schutel, que hoje tem sede própria na Rua Pinto Ferras, 70 - Vila Mariana, e realiza reuniões de estudos e mediúnicas, abertas ao público, nas quartas e sextas-feiras, às 20h30, e nos sábados, às 14h. Existe um trabalho de assistência a gestantes carentes, que é coordenado pela minha tia Maria de Lourdes.

Ele ajudou algum outro centro espírita a ser fundado?

Em 1936 Herculano Pires foi eleito presidente do primeiro Centro Espírita, que dois amigos seus fundaram, na cidadezinha de Cerqueira Cesar. Além disso, ele realizava palestras em vários centros, por todo o Brasil.

Havia algum lugar ou horário para escrever?


Escrevia em qualquer horário, bastava ter um tempo disponível. Quando se aposentou, passou a escrever mais durante a noite, entrando pela madrugada. Seu escritório de trabalho era seu próprio quarto, onde também se encontrava sua biblioteca.

Deixe-nos uma mensagem:


Herculano Pires, como dizia Chico Xavier, foi quem mais se aprofundou e compreendeu a obra de Kardec. Faz parte dos espíritas que mais se preocuparam com a divulgação da doutrina, sem permitir que novidades, sem nenhum critério científico, fossem consideradas pertencentes a ela. Ele sempre deixou bem claro que, se acreditamos nas verdades espíritas não podemos nos omitir quando encontramos situações que possam provocar distorções na obra de Kardec.

O jornalista e escritor Jorge Rizzini foi amigo, companheiro de profissão e confidente de Herculano Pires durante trinta anos. Jorge também presidiu o Clube dos Jornalistas Espíritas do Estado de São Paulo, criou a primeira revista infanto-juvenil espírita (Kardequinho), e a primeira filmoteca espírita nacional. Psicografou quarenta e quatro poetas, entre eles, Castro Alves e Monteiro Lobato.

Jorge e Herculano se conheceram no ano de 1952, em São Paulo, na tradicional e atualmente extinta Livraria Teixeira, ponto de encontro de intelectuais da época. "Eu tinha vinte e oito anos e ele trinta e oito. Um fato curioso que nascemos ambos no dia 25 de setembro, ele em 1914, durante a primeira grande guerra e eu dez anos depois, no período da revolução de 1924. Mas, segundo relatos espirituais, nossa amizade tem razões em vidas anteriores, desde o tempo da Roma imperial, quando trabalhamos secretamente em favor do triunfo das idéias revolucionárias de Cristo", conta.

O vínculo de amizade e companheirismo foi tão grande entre ambos, que Jorge Rizzini publicou o livro José Herculano Pires, O Apóstolo de Kardec, pela editora Paidéia.

Como definiria Herculano Pires?

Foi o que podemos chamar de "homem múltiplo". Filósofo, educador, jornalista, escritor, parapsicólogo, romancista, poeta, e fiel tradutor de Allan Kardec. Sua inteligência superior iluminada pelo espiritismo e aliada a uma cultura humanística, brilhou com grande magnitude. As dezenas de livros doutrinários que escreveu, inclusive em parceria com Chico Xavier, são fundamentais para o perfeito conhecimento do espiritismo, e, devo acrescentar, alguns de seus romances são autênticas obras-primas.

Tem conhecimento de como Herculano Pires tornou-se espírita?

Até os quinze anos de idade era católico, mas desiludiu-se com o clero porque não respondia satisfatoriamente às suas perguntas. E buscou-as na teosofia, em vão. Já estava aceitando o materialismo, quando lhe caiu nas mãos um exemplar de O Livro dos Espíritos.

Eis o que ele nos narrou o que ocorreu: "Eu não queria saber do espiritismo, que por minha formação, considerava supersticioso. Em 1936, quando tinha 22 anos de idade, meu saudoso amigo Dadício de Oliveira Baulet me desafiou a ler O Livro dos Espíritos". Esse foi o ponto de partida.

Para Herculano, o que significa ser espírita?

Disse ele em entrevista concedida ao Diário de São Paulo, em junho de 1952: 'É sempre transformar os princípios doutrinários em norma viva de conduta, para todos os instantes de nossa curta existência na Terra. Praticar o espiritismo não apenas no recinto dos centros ou no convívio dos confrades, mas em toda parte em que nos encontremos na rua, no trabalho, no lar, na solidão dos próprios pensamentos".

Ele participou do movimento espírita durante décadas. Como foi seu início?

Atuou como líder quarenta e três anos consecutivos.

Foi o primeiro presidente do centro espírita Humberto de Campos, na cidade de Cerqueira César. Recordemos que Herculano contava apenas com vinte e dois anos de idade, mas já era jornalista e escritor.

Quem publicou o primeiro trabalho jornalístico de cunho espírita de Herculano?

Ele tinha vinte e quatro anos, quando remeteu o primeiro artigo de cunho espírita ao inesquecível Cairbar Schutel, que encantado, publicou na Revista Internacional de Espiritismo. Desde então, nunca mais parou de escrever na imprensa espírita e fazer palestras.

Como foi a fundação e atuação do Clube dos Jornalistas Espíritas de São Paulo?

Herculano Pires fundou o clube em 1948. Participaram inclusive escritores e grandes profissionais da imprensa da época. Faziam parte: Pedro Granja, Júlio Abreu Filho. Odilon Negrão, entre outros. A ação do clube não se limitava ao movimento espírita brasileiro. Chegou até mesmo a protestar contra o governo do ditador Perón, por obrigar os médiuns argentinos a se registrarem no Departamento de Psicopatologia, com fichário de exames psiquiátricos como se fossem doentes mentais. Protesto este amplamente noticiado pela grande imprensa de São Paulo e do Rio de Janeiro. Enfrentava também opositores do espiritismo e denunciava os confrades que mistificavam dentro do movimento doutrinário.


Érika Silveira - Revista Cristã de Espiritismo

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