quarta-feira, 30 de março de 2011

A Conquista da Felicidade


Por Clara Lila Gonzales de Araújo


“A conquista da felicidade como obra de educação”

“Ele disse: Bem-aventurados, antes, os que ouvem a palavra de Deus e a guardam.” (Lucas, 11:28.)



O capítulo V, de O Evangelho segundo o Espiritismo, traz fulgente mensagem do cardeal Morlot, recebida em Paris, no ano de 1863, sobre a felicidade, que é almejada como condição de satisfação plena de todo ser humano.

O preclaro Espírito chama atenção para a possibilidade de nunca podermos alcançá-la, pois “o homem absolutamente feliz jamais foi encontrado”.

Afirma ele que o que consiste a felicidade na Terra é coisa tão efêmera para aquele que não tem a guiá-lo a ponderação, que, por um ano, um mês, uma semana de satisfação completa, todo o resto da existência é uma série de amarguras e decepções. [...]

Diante dessa constatação, o anseio de felicidade seria puramente quimérico para as almas aqui reencarnadas? Eis um velho e complicado mistério filosófico sem solução racional, pois enquanto o homem resumir a felicidade na utilização de bens materiais, na deplorável ilusão de que o legítimo contentamento está condicionado aos tesouros perecíveis, não conseguirá atingir a paz e o bem-estar que tanto almeja. Emmanuel, Benfeitor espiritual, em uma de suas luminosas obras, ao analisar de que modo pode-se conceber a felicidade na Terra, faz a seguinte ponderação:

– Se todo espírito tem consigo a noção de felicidade, é sinal que ela existe e espera as almas em alguma parte. Tal como sonhada pelo homem do mundo, porém, a felicidade não pode existir, por enquanto, na face do orbe, porque, em sua generalidade, as criaturas humanas se encontram intoxicadas e não sabem contemplar a grandeza das paisagens exteriores que as cercam no planeta. Contudo, importa observar que é no globo terrestre que a criatura edifica as bases da sua ventura real, pelo trabalho e pelo sacrifício, a caminho das mais sublimes aquisições para o mundo divino de sua consciência.

Ao longo da história da Humanidade o homem buscou respostas para as suas inquietações, como necessidade imperiosa de superação das suas dores, originadas, principalmente, das frustradas conquistas de melhoria existencial. Entre os gregos, a felicidade seria alcançada pela procura do bem supremo e da virtude. Sócrates (470-399 a.C.), “considerado o pai da ciência moral, que a exemplificou em si mesmo, em caráter apostolar”, tornou-se o “verdadeiro pioneiro das ideias cristãs e espíritas” e contribuiu para conceituar a felicidade através do “seu legado ético [...] de relevante valor moral e espiritual, rescendendo o sutil aroma da sua filosofia de vida”.

Aristóteles (384-322 a.C.) faz da felicidade “a atividade da alma dirigida pela virtude”.

No século XVIII, Immanuel Kant (1724-1804) critica as correntes de pensamento que sugerem a obtenção da felicidade por meio dos sentidos ou que fazem dela um objeto da razão pura. Para o filósofo, “a felicidade é sempre uma coisa agradável para aquele que a possui”, mas deve considerar, “como condição, a conduta moral conforme a lei”. A felicidade, pois, tem sido aspiração de todos os povos, através dos tempos, mesmo que o desapontamento de muitos, com relação a ela, tenha resultado em pessimismo e desesperança, mormente na fase atual em que o homem moderno experimenta vicissitudes jamais imaginadas, deixando- se envolver pelo imediatismo ditado, sobretudo, pelas paixões deprimentes e desordenadas como novas “formas de amor” para se atingir a decantada satisfação de viver plenamente.

Essa importante questão tem sido cuidadosamente analisada pelos Espíritos superiores, tratando-se de problema a ser solucionado pela educação moral das massas humanas, sabedores de que o enigma da felicidade é de natureza espiritual. Em comentário da resposta à pergunta 933, de O Livro dos Espíritos, Allan Kardec tece valiosos esclarecimentos a esse respeito:

De ordinário, o homem só é infeliz pela importância que liga às coisas deste mundo. Fazem-lhe a infelicidade a vaidade, a ambição e a cobiça desiludidas. [...] Aquele que só vê felicidade na satisfação do orgulho e dos apetites grosseiros é infeliz, desde que não os pode satisfazer, ao passo que aquele que nada pede ao supérfluo é feliz com o que os outros consideram calamidades. [...] Como civilizado, o homem raciocina sobre a sua infelicidade e a analisa. Por isso é que esta o fere. Mas, também, lhe é facultado raciocinar sobre os meios de obter consolação e de analisá-los. Essa consolação ele a encontra no sentimento cristão, que lhe dá a esperança de melhor futuro, e no Espiritismo que lhe dá a certeza desse futuro.

A Doutrina Espírita traça para nós um roteiro de vida capaz de proporcionar a felicidade almejada, ainda que venhamos a sofrer, de acordo com o nosso estágio evolutivo. A felicidade é resultante de muitas conquistas, conforme ressalta o autor espírita Juvanir Borges de Souza (1916-2010), entre elas:

A “fé no futuro”, a que se referem os Instrutores Espirituais da Terceira Revelação, deixa de ser apenas esperança vaga para se tornar certeza plena adquirida pelo conhecimento das realidades eternas. [...] dando ao adepto sincero segurança e autoconfiança.

Para termos otimismo, precisamos ter fé. “[...] Sem fé ninguém pode ser feliz. Sem fé e sem amor não há felicidade”.

A felicidade, assim, depende das qualidades conquistadas e não do meio material no qual os seres humanos se encontram. Esse alcance, entretanto, exigirá grande esforço de nossa parte; sendo ela consequência de muitas vitórias de ordem moral, é obra de autoeducação e intensa luta será travada para granjear a reforma íntima que ansiamos.

Ao analisar as aflições humanas, Kardec adverte-nos quanto à origem dos males terrestres, reconhecendo que o homem, na maioria dos casos, “é o causador de seus próprios infortúnios; mas, em vez de reconhecê-lo, acha mais simples, menos humilhante para a sua vaidade acusar a sorte, a Providência, a má fortuna, a má estrela, ao passo que [...] é apenas a sua incúria”.

Alerta-nos ele:

Interroguem friamente suas consciências todos os que são feridos no coração pelas vicissitudes e decepções da vida; remontem passo a passo à origem dos males que os torturam e verifiquem se, as mais das vezes, não poderão dizer: Se eu houvesse feito, ou deixado de fazer tal coisa, não estaria em semelhante condição. A quem, então, há de o homem responsabilizar por todas essas aflições, senão a si mesmo? [...]

Só seremos felizes quando compreendermos o valor das oportunidades que nos chegam do Alto, a cada reencarnação, sabendo aproveitar as experiências necessárias ao nosso progresso intelectual e moral, por meio das ações materiais, cuja execução Deus nos confia. Quanto mais difícil a existência, maior será a satisfação de superar, com resignação e denodo, as provas e as privações inúmeras que nos atingem. Geralmente, a felicidade surge da própria dor e da satisfação de tê-la vencido. Sobre isso, sábio conselho é transmitido pelos Espíritos reveladores:

Os males deste mundo estão na razão das necessidades factícias que vos criais. A muitos desenganos se poupa nesta vida aquele que sabe restringir seus desejos e olha sem inveja para o que esteja acima de si. O que menos necessidades têm, esse o mais rico.

E eles complementam:

[...] Quando um justo é infeliz, isso representa uma prova que lhe será levada em conta, se a suportar com coragem. Lembrai-vos destas palavras de Jesus: Bem-aventurados os que sofrem, pois que serão consolados.

Saber e virtude serão adquiridos após longo aprendizado na sementeira do amor e da caridade. É imprescindível a prática da fraternidade, da bondade e da justiça para que sejamos cooperadores da obra educativa do Espiritismo, tal como ensinou Jesus, e fruiremos, paulatinamente, de autêntica felicidade!


Fonte: Reformador, março de 2011

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