terça-feira, 27 de março de 2012

O Papel Psicológico do Perispírito. – A Identidade


A vida psíquica de todo ser pensante apresenta uma continuidade assecuratória de sua identidade. É por não sentirmos lacuna em nossa vida mental, que nos certificamos de ser a mesma, sempre, a individualidade em nós residente. A memória religa, de forma ininterrupta, todos os estados de consciência, da infância à velhice. Sob a forma de lembranças, podemos evocar eventos do passado, dar-lhes vida factícia, julgar-lhes as fases, dar-nos conta de que, mau grado todas as vicissitudes, lutas, abalos morais, desfalecimentos ou triunfos da vontade, é sempre o mesmo eu que odiou ou amou, gozou ou sofreu. Numa palavra: que somos idênticos.

Em que parte do ser reside essa identidade?

Evidentemente, no espírito, pois é ele que sente e quer. Na Terra, as faculdades intelectuais estão ligadas, em suas manifestações, a um certo estado do corpo, e o cérebro é o órgão pelo qual o pensamento se transmite ao exterior. O cérebro, porém, muda perpetuamente, as células dos seus tecidos são incessantemente agitadas, modificadas, destruídas por sensações vindas do interior e do exterior. Mais do que as outras, essas células submetem-se a uma desagregação rápida e, num período assaz curto, são integralmente substituídas.

Como conceber, então, a conservação da memória e, com esta, a identidade?

De nossa parte, não hesitamos em crer que o perispírito, ainda aqui, representa um grande papel, evidenciando a sua necessidade, visto como os argumentos que validamos, para o mecanismo fisiológico, melhor ainda se aplicam ao funcionamento intelectual, bem mais intenso e variado que as ações da vida vegetativa ou animal. Dessas duas ordens de fatos, bem comprovados, resulta: a renovação incessante das moléculas e a conservação da lembrança, que as sensações e os pensamentos registrados não o são apenas no corpo físico, mas também no que é imutável – no invólucro fluídico da alma. Eis como se pode representar o fenômeno.

Todo o mundo sabe que para termos uma sensação faz-se preciso que um dos órgãos dos sentidos seja excitado por um movimento vibratório, capaz de irritar o nervo correspondente.

O choque recebido propaga-se até ao cérebro, onde a alma toma conhecimento dele, por um fenômeno dito de percepção. Mas, nós sabemos que, entre o cérebro e a alma, está o perispírito, que aquele choque deve atravessar, deixando-lhe um traço.

Com efeito, ao mesmo tempo em que é percebida a sensação – o que se dá no instante em que a célula cerebral entra a vibrar –, o perispírito, que transmitiu ao espírito o movimento, registrou-a.

A célula pode, então, desaparecer, cumprida a sua tarefa. A que lhe deva suceder será formada pelo perispírito, que lhe imprimirá os mesmos movimentos vibratórios que recebera. Destarte, a sensação será conservada e apta a reaparecer, quando o queira o espírito.

Importa, necessariamente, assim seja, pois a certeza do trabalho molecular do cérebro é absoluta. Pode-se até medir a intensidade da atividade intelectual pela elevação de temperatura das camadas corticais e pelas perdas excrementosas consequentes.

O substrato material é incessantemente destruído e reconstituído.

Não fosse o perispírito uma espécie de fonógrafo natural, a registrar sensações para reproduzi-las mais tarde, impossível se tornaria adquirir conhecimentos, pois o novo ser, aquele que incessantemente substitui o antigo, nada conhece do passado.

Lógico é, pois, admitir que o perispírito tem grande importância do ponto de vista psíquico, e nada há nisso que nos deva surpreender, por isso que, em suma, ele faz parte da alma e lhe serve de agente junto à matéria.


Gabriel Delanne

Do livro “Evolução Anímica”, de Gabriel Delanne.

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